Guia avalia esquema para fumantes em quatro casas noturnas paulistanas

No primeiro minuto desta sexta-feira, 7 de agosto, quando a lei antifumo entrou em vigor, o Guia da Folha Online já estava nas ruas de São Paulo para dar uma espiada nas casas noturnas. A equipe escolheu dois clubes da Barra Funda --o Clash e a D-Edge-- e dois da rua Augusta --o Tapas e o Vegas-- para avaliar as alternativas criadas por eles para cumprir a lei sem perder os clientes fumantes. Acompanhe o relato:

Barra Funda

Crédito: Reprodução

Valendo! As primeiras horas da lei antifumo em vigor foram tranquilas na Barra Funda. Depois de passar pela revista --que não encrencou com o maço de cigarro na minha bolsa-- e pelo caixa do Clash Club, um homem alto e forte entregava um flyer e balbuciava algo como "sobre a lei antifumo" para cada um que adentrava a casa.

"Caros Amigos do Clash, a partir de agosto não será mais permitido fumar em ambientes fechados em São Paulo. O Clash apoia a lei antifumo e se organizou para obedecer à lei. Assim, a partir de 1º de agosto, o único local em que será permitido fumar no Clash é nossa área externa, localizada atrás da chapelaria. pedimos a colaboração de todos para que essa lei, apoiada pela maioria absoluta da população, possa ter resultados benéficos que todos esperamos."

Óbvio que esse foi o assunto na pista, que à 0h30 ainda não fervia. O "point", na verdade, era lá atrás, no "fumódromo". A tal da área externa é agradável, com banquinhos de madeira, uma árvore pequena no meio do caminho e um bar desativado. Cheguei a contar 40 pessoas --entre fumantes, acompanhantes, curiosos e um segurança da casa-- contra o mesmo número na pista, infinitamente mais espaçosa e interessante. Problema será quando chover: os fumantes terão que disputar uma vaga embaixo do toldo preto, instalado em uma das paredes da área aberta.

De volta à pista, já cheia, ar e chão limpos. Nas laterais da casa, dois seguranças usando o "bottom" da campanha antifumo observavam o público, na caça de algum esperto. As moças e os moços da limpeza também estavam uniformizados, de olho tanto no chão --alvo de bitucas-- quanto nos banheiros. Pelas paredes, placas da lei alertavam os possíveis desavisados. Até as 2h da manhã, nada de a fiscalização do governo passar por lá. Desnecessária, no caso, pois estava tudo dentro dos conformes.

  • Próxima parada: D-Edge
Crédito: Apu Gomes/Folha Imagem

No D-Edge, a noite foi mais emocionante. Fila grande, como de praxe, mas a justificava recaía sobre a lei. "Essa demora toda é porque estão revistando as pessoas, não pode entrar com cigarro", comentava uma jovem impaciente. Enquanto isso, próximo à entrada, um dos seguranças arrastava pela cintura uma moça teimosa, que insistia em fumar embaixo do toldo. "Estou na rua, eu posso fumar", gritava ela. "Só pode fumar da grade para lá", explicava o segurança. Até eu conseguir chegar à porta, mais um caso desse entreteve a fila.

Minha vez de entrar, abri a bolsa e o maço de cigarro fez a segurança que revistava as mulheres entortar o bico: "pode entrar com o cigarro, mas aconselho deixar na chapelaria, porque não pode fumar lá dentro". Checou mais uma vez minha bolsa e liberou a passagem.

Em meia hora na pista, três ou mais seguranças passaram por mim. Dos banheiros ao bar, de olhos nas mãos e em quem estava mais de canto. A escuridão da casa facilitava um tanto enxergar a brasa do cigarro e a fumaça. Mal terminei essa observação e um segurança grudou em dois garotos que estavam ao meu lado. Um deles tinha acabado de levar o cigarro à boca. Apesar de sutil, a bronca causou constrangimento em quem estava ao redor, e muito mais no rapaz, que jogou o item proibido no chão e saiu de fininho.

Hora de fumar lá fora. Uma fila se formava na saída, mas os fumantes procuravam um procedimento mais fácil. "Tem que pegar essa fila mesmo", informava, com muita paciência, a funcionária da chapelaria, que ficava junto aos caixas. Mais 20 minutos de fila e de reclamação. Depois de acertar a conta, uma pulseirinha rosa com o nome da casa grafado era atachada ao pulso. Quem deixou bolsa na chapelaria, não precisava se preocupar. Na hora de ir embora, bastava mostrar o acessório e retirar os pertences. Na calçada, olhei para todos os lados e não havia nenhum fiscal oficial. Sem problemas, voltei para a pista, com outra comanda e menos paciência.

Rua Augusta

Crédito: Rodrigo Marcondes/Folha Imagem

O fumante que quiser curtir a noite no "baixo Augusta" deve ir munido de calma. No Tapas Club, por exemplo, o esquema é complicado. Quem for fumar deve entrar pela porta da direita e ir direto ao caixa, onde já precisa pagar os R$ 10 de entrada. Uma marca de carimbo na mão permite que a pessoa saia pela porta da esquerda para fumar na calçada.

Se for consumir algo, tem que comprar uma cartela no valor de R$ 45 --caso não utilize tudo, pode retirar o reembolso no fim da noite. Um dos problemas, no entanto, é que a cartela de consumação é composta apenas de números redondos. Assim, se a pessoa comprar algo de R$ 4,50, deve avisar ao rapaz do caixa, para que ele lhe devolva os centavos.

Na madrugada desta sexta-feira (7), dois fiscais do Procon e da Vigilância Sanitária, que circulavam pela rua Augusta, inspecionaram o local. Mas não encontraram nada de irregular. Apesar do procedimento complicado, o esquema funcionou bem: os fumantes se apinhavam na frente da balada, tomando a calçada, enquanto a casa ficava praticamente vazia.

Crédito: Apu Gomes/Folha Imagem

Já no Vegas, o sistema de adequação à nova lei gerou confusão. A casa reservou um espaço externo, na calçada, para quem quer fazer fumaça. Ali cabem mais ou menos dez pessoas, que os seguranças liberam aos poucos, à medida que a área é esvaziada. Não é preciso pagar consumação, basta colocar uma pulseira e fumar sob os olhares atentos dos seguranças --que, a qualquer movimento, temem que o fumante fuja.

Além de fila para entrar, para beber, para ir ao banheiro e para pagar, no Vegas o fumante agora enfrenta fila para fumar. Às 2h30 desta sexta era preciso aguardar 15 minutos --com direito a tumulto, empurra-empurra, gente furando fila e seguranças nervosos-- para poder fumar na parte externa. A fila contava com 15 pessoas, e a confusão se agravava com a saída --a porta estreita para sair da casa é a mesma que serve aos fumantes.

  • Os indecisos

Tanto no Tapas Club quanto no Vegas os seguranças pouco sabiam como conduzir os indecisos --pessoas que não fumam, mas que queriam acompanhar amigos fumantes, ou casos como o da mocinha que perguntou, no Tapas: "Moço, eu não entrei com comanda de fumante, mas agora eu quero fumar um cigarro, como eu faço?" Esses foram encaminhados ao mesmo procedimento que os fumantes.

Parece que no primeiro dia de vigência da nova lei não houve irregularidades nas casas visitadas. Ainda que as baladas continuem vendendo cigarros, não foram vistas pessoas fumando dentro do local, mesmo no banheiro ou em partes mais escuras --seguranças circulavam pelo espaço para se assegurar de que ninguém burlaria a lei.

Na parte de fora, os fumantes resistiram bravamente ao frio e à garoa. Alguns, entretanto, desistiam de sair. Tanta confusão é de dar preguiça de fumar.

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As informações estão atualizadas até a data acima. Sugerimos contatar o local para confirmar as informações

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